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O loteamento de acesso controlado na Lei nº 13.645/2017

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Por Silviane Scliar Sasson

Uma das mais polêmicas novidades trazidas pela Lei nº 13.465/2017 é a figura do loteamento de acesso restrito. Mediante inclusão do parágrafo 8º ao art. da Lei nº 6.766/1979[1] (Lei de Loteamentos), a nova lei passa a possibilitar que os loteamentos tenham seus acessos restritos por meio de muros, portarias, cercas ou outras formas de controle. Esta possibilidade dependerá sempre de ato administrativo do município em que se localiza o loteamento, a quem caberá autorizar ou não a restrição de acesso, e em que limites e condições.

Ao contrário do condomínio de lotes, cuja regulamentação pela nova lei foi comemorada pelo mercado imobiliário, a inovação legal prevendo a possibilidade de restrição de acesso a loteamentos causa certa apreensão. As diferentes reações diante dessas duas novidades legislativas decorrem da própria distinção entre os dois institutos. Enquanto nos condomínios de lotes cada um dos lotes é uma unidade autônoma integrante de um condomínio composto também por áreas comuns (acessos, ruas internas, portarias, salões de festa etc.), cujas frações ideais pertencem aos mesmos proprietários dos lotes[2], o loteamento tradicional é decorrente da subdivisão de uma gleba[3] em vários lotes menores, mediante abertura de novas vias públicas, sem que existam quaisquer áreas comuns pertencentes aos proprietários dos lotes. No loteamento, portanto, as ruas, calçadas e praças são públicas e, pela essência de sua natureza de bem público, passíveis de uso e acesso por toda a população.

O loteamento de acesso restrito (ou “loteamento fechado”, como já se convenciona chamar) não é uma modalidade nova de loteamento e não se confunde com um condomínio. Trata-se do loteamento tradicional que, com o advento da nova lei, poderá ter os acessos controlados por seus moradores ou associação que os represente.

Ao contrário do condomínio de lotes, em que todas as áreas destinadas a ruas e acessos são propriedade privada, com a entrada e a circulação por não moradores podendo ser proibidas a exclusivo critério dos proprietários, nos loteamentos de acesso restrito não será permitido impedir ou bloquear o acesso de veículos ou de pedestres, desde que os visitantes se submetam à identificação e cadastramento. O objetivo desta vedação, como não poderia deixar de ser, é evitar que as cidades se tornem – mais do que já são – feudos murados e objeto de controle por particulares.

A crítica a esta possibilidade de restrição ao livre acesso às áreas loteadas, portanto, é naturalmente compreensível.

É que, embora as ruas que permeiam um loteamento sejam públicas, integrando o planejamento urbano, compondo as áreas de circulação, a dinâmica do fluxo e o próprio “respiro” das cidades, o Poder Público Municipal poderá, mediante acordos com associações de bairros e moradores ou seus representantes, por critérios discricionários[4], permitir a restrição e o controle de acesso a determinados loteamentos. Embora a lei estabeleça a vedação a um bloqueio irrestrito, é bastante provável que, na prática, isso venha a ocorrer, com a consequente destinação de bens públicos ao uso privativo de moradores.

É importante observar que os inúmeros loteamentos que são hoje irregularmente fechados, e comportam-se como verdadeiros condomínios, não passarão a estar regulares a partir da possibilidade de controle de acesso prevista na nova lei. A regularização não é automática nem imediata e dependerá de expressa autorização e regulamentação do Município, além, é claro, da concordância da totalidade dos proprietários dos lotes.

Ao mesmo tempo em que a atualização na legislação urbanística trazida pela Lei nº 13.645/17 veio em boa hora, regulamentando institutos que já eram uma realidade do mercado imobiliário, mas estavam à margem da lei ou eram estabelecidos mediante subterfúgios, como o condomínio de lotes, a nova lei pode acabar contribuindo para a transformação de áreas, antes públicas e de livre acesso, em verdadeiros aglomerados de muros, cercas e portarias. É a legislação urbanística tentando minimizar um problema que pertence à outra seara: a da segurança pública.

[1] Lei 6766/79 – Art. 2º. O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou desmembramento, observadas as disposições desta Lei e as das legislações estaduais e municipais pertinentes.

  • 8o Constitui loteamento de acesso controlado a modalidade de loteamento, definida nos termos do § 1o deste artigo, cujo controle de acesso será regulamentado por ato do poder público Municipal, sendo vedado o impedimento de acesso a pedestres ou a condutores de veículos, não residentes, devidamente identificados ou cadastrados.

[2]Conforme regras do condomínio edilício estabelecidas pelo Código Civil.

[3]Unicamente conforme Lei 6766/79.

[4]BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 359- “Atos discricionários são aqueles em que o administrador, em razão da maneira com a matéria foi regulada pela lei, deve levar em consideração as circunstâncias do caso concreto, sendo inevitável uma apreciação subjetiva para cumprimento da finalidade legal.”

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